A discrepância positiva como resultado da análise da dentição mista sugere que haverá sobra de espaço após a esfoliação dos dentes decíduos posteriores. Contudo, é importante que o clínico saiba interpretar esse resultado além do valor numérico da estimativa pois na prática o apinhamento pode se manter na dentição permanente mesmo diante de um resultado positivo.

Análise da dentição mista na prática clínica

O aproveitamento do Leeway Space

Conduta clínica diante da discrepância positiva

Análise da dentição mista na prática clínica

A análise da dentição mista consiste em se obter uma previsibilidade de espaço entre o espaço presente no arco e o espaço requerido para o alinhamento de todos os dentes permanentes no arco.

A análise da dentição mista está longe de ser um cálculo preciso e exato. Aliás, vamos falar a verdade, quando falamos de ciências biológicas, em se tratando de números, dificilmente falaremos de conclusões exatas. Sempre falaremos em média, estimativa, probabilidade…enfim…com a análise da dentição mista não é diferente.

Partindo do princípio que os dentes permanentes possuem relação de tamanho entre si é possível entender que é possível estimar ou predizer o tamanho dos dentes permanentes não irrompidos tendo como base os dentes que já irromperam.

Nas últimas semanas fiz outros posts aqui no Blog falando um pouquinho mais do cálculo e da análise propriamente dita.

Por que fazer análise da dentição mista?

Como fazer a análise da dentição mista?

Análise da dentição mista: Discrepância nula, o que fazer?

O fato é que a análise da dentição mista auxilia na escolha da conduta terapêutica oferecendo embasamento ao clínico e evitando muitas vezes tratamentos com dispositivos expansores desnecessários.

O aproveitamento do Leeway Space

O Leeway Space consiste no espaço “livre”, ou seja, o espaço que sobra considerando o tamanho de caninos e molares decíduos em relação ao tamanho de caninos e pré-molares permanentes.

Grande parte do espaço que “sobra” nessa troca dos dentes posteriores está concentrada na diferença entre o segundo molar decíduo e o segundo pré-molar permanente, chamado de “espaço E”, já que, o tamanho de canino e primeiro molar decíduo é praticamente equivalente ao tamanho de canino e primeiro pré-molar.

Portanto, ao esfoliar o segundo molar decíduo haverá uma perda de espaço pela mesialização espontânea do primeiro molar permanente, o que implica em perda do espaço presente calculado na discrepância de modelos. Por isso é importante que o clínico entendo que a discrepância de modelo (espaço presente – espaço requerido) calculada na dentição mista somente será uma “realidade” se o espaço E for preservado em sua totalidade.

Em casos de discrepância positiva podemos entender que haverá “sobra de espaço” na troca dos dentes decíduos posteriores, porém se a mesialização do primeiro molar for maior que a discrepância de modelo, essa discrepância não será mais positiva.

Vamos a um exemplo prático: 

O paciente XX de 9 anos apresenta espaço presente de 72 mm. A estimativa para o espaço requerido de acordo com o método de Tanaka-Johnston foi de 70 mm.

Para saber mais sobre o método de Tanaka-Johnston confira o conteúdo do blog abaixo:

Como fazer análise da dentição mista?

No caso acima, a diferença entre o espaço presente (72 mm) e o espaço requerido (70 mm) é de 2 mm, ou seja, a discrepância de modelos é de 2 mm.

Isso quer dizer que haverá sobra de 2 mm na troca dos molares decíduos pelos pré-molares. Contudo, a literatura mostra que em média, no arco inferior, há uma sobra de espaço em torno de 3.4 mm no total, ou seja, 1,7 mm de sobre em cada hemiarco.

Portanto, vamos imaginar que o primeiro molar permanente pode mesializar em média 1.7mm em cada hemiarco….esse dente vai “tentar” rapidamente aproveitar esse espaço ao esfoliar o segundo molar decíduo. 

No caso acima, nosso cálculo indica que haverá uma sobra de espaço de 2 mm no arco. Nesse caso, vamos considerar uma sobra de 1mm em cada hemiarco. Portanto, se o molar mesializar 1,7mm de cada lado haverá uma falta de espaço para alinhamento de todos os dentes permanentes no arco, certo?

É nessa perda que devemos pensar quando estamos diante de um caso com discrepância positiva pois em muitos desses casos ainda assim será necessário a instalação de um arco lingual.

Na prática, sempre refaço esse cálculo no segundo período transitório e, de acordo com o apinhamento presente ainda no arco eu faço a instalação de um arco lingual nessa fase, mesmo com a discrepância de modelo positiva.

Conduta clínica diante da discrepância positiva

O que temos que entender é que na dentição mista o apinhamento é concentrado na região anterior. Considerando que diante da discrepância positiva a sobra de espaço irá ocorrer na mesial do primeiro molar permanente e que o primeiro molar vai mesializar imediatamente após a esfoliação do segundo molar decíduo, é possível entender que se não fizermos nada é muito provável que o apinhamento se mantenha concentrado na região anterior.

Por isso, diante da discrepância positiva, uma das formas de permitir o bom alinhamento dos dentes é realizar desgaste na mesial do primeiro molar decíduo para permitir que o canino se posicione mais posterior. Da mesma forma podemos fazer desgaste posteriormente na mesial do segundo molar decíduo prévio a irrupção do primeiro pré-molar.

Cuidado: Importante a janela clínica para realizar esse desgaste é bem pequena pois o ideal é realizá-lo logo após a esfoliação do dente decíduo antecessor e antes da irrupção do dente permanente, pois assim evitamos o dano ao dente permanente. 

Observe na imagem como o desgaste foi realizado nessa situação clínica. O desgaste não é essencial, mas permite que caninos e pré-molares possam se posicionar mais para posterior à medida que se posicionam no arco.

Portanto, mesmo diante da discrepância de modelo positiva no arco inferior, a instalação de um arco lingual pode ser necessária.

Esse desgaste dificilmente será realizado no arco superior. Aliás, de maneira geral costuma fazer a análise da dentição mista somente no arco inferior e a partir desse posicionar caninos e molares superiores. Por isso que a discrepância no arco superior não será um fator determinante para o tratamento. Quando pensar no planejamento ortodôntico interceptivo ou mesmo corretivo, tenha em mente que o arco inferior será sempre a nossa referência clínica.

Bons estudos!!